O PENSAMENTO DO DESIGNEduardo Barroso Neto
Nos últimos anos especialistas em marketing começaram a usar o termo “Design thinking” para definir o pensamento e modo particular como os designers abordam os problemas. Essas tentativas, por serem formuladas por profissionais de outras áreas, sempre deixaram de apontar detalhes fundamentais que, no meu entendimento, fazem grande diferença entre o pensamento do design e aquilo que chamam de “design thinking”.
Os teóricos do design tentaram explicitar através de estudos e pesquisas a metodologia diferenciada do design, com seus passos e abordagens características, mas nunca se atendo ao mecanismo cerebral que opera esses métodos descritos.
Poucos se preocuparam em abordar características que são indispensáveis em nosso trabalho, como o de decidir diante de incertezas ou de um grande número de variáveis. Atuar dentro de uma lógica nebulosa, que utiliza a intuição como bússola. A intuição é uma característica pouco confiável para muitos e mesmo temerária para engenheiros e tecnólogos, mas vital no design. A essa capacidade de decidir assertivamente, encontrando as soluções mais surpreendentes e inovadoras, damos o nome de talento.
A maioria dos designers, preocupados em fazer, se esqueceram de explicitar o que os distingue de outros especialistas principalmente dos arquitetos, dos engenheiros, dos publicitários e artistas de modo geral. Os designers têm com eles em comum apenas o fato que criarem novas realidades, definindo a cultura material de um tempo e lugar.
Porém é nos detalhes desse processo de criação que começam as diferenças, que embora possam parecer sutis, fornecem a chave para a compreensão desse mecanismo mental. A primeira pergunta que um designer faz é: para quem e por que vou projetar? Quem projeta para si próprio é o artista. O designer projeta para o usuário de seu produto ou serviço, levando em consideração suas necessidades, desejos e anseios, tarefa que exige tempo, informação, ferramentas específicas, sensibilidade e intuição.
Um designer buscar começar por onde ninguém ainda esteve. Somente assim surgem as coisas verdadeiramente novas e com elas a surpresa e o encantamento. Este processo não usual de abordagem de um problema é fruto do pensamento que acima de tudo questiona e interroga. Um designer é um inconformista por natureza que acredita que tudo pode, e deve ser melhorado.
Designers sabem que os produtos são nossos cúmplices e exprimem o estilo de vida que adotamos. Um designer, por princípio ético, não pode se eximir de sua responsabilidade política, pois ao projetar está fazendo uma afirmação sobre suas convicções, do tipo de sociedade e de futuro que aspira. Este discurso, de difícil adequação na vida real, e em função das exigências do mundo capitalista, é outro elemento fundamental de distinção do “pensamento do design”.
A principal característica do pensamento do design é sua assimetria, ou condição de não linearidade. A linearidade pressupõe um processo de melhoria do grau de qualidade de um serviço ou produto de modo incremental, com modificações ou acréscimos sucessivos sobre um padrão existente. O pensamento assimétrico corresponde à capacidade de analisar, e vivenciar simultaneamente situações diferentes que se cruzam, se convergem ou se divergem. Essa assimetria permite visualizar novas possibilidades através de caminhos ainda não trilhados, estimulando e propiciando abordagens não convencionais, espontâneas e aleatórias como principio gerador de novas ideias. O pensamento do design explora varias possibilidades, mesmo que sejam divergentes ou antagônicas. Distingue-se por oposição do pensamento linear, racional e previsível. Um designer, consciente que o todo é a soma das partes, começa por enfocar o todo e não uma parte de algo que não esta mais funcionando.
Um designer deve ser também um decodificador de sinais e mensagens, que apontam para mudanças comportamentais da sociedade propondo um futuro diferente do passado. Isso implica em ter o ser humano centro das preocupações, pois dele partem as exigências que devem orientar a busca de soluções. Contudo, o que os homens desejam varia de lugar e tempo. Portanto é necessário focar os indivíduos e precisar seu problema. Cada produto resultante do trabalho de um designer deve considerar desde as necessidades básicas da sociedade até as expectativas e desejos dos pequenos grupos sociais.
40 anos de atividade profissional como designer, atuando em todas as suas variantes, me permite concluir que é a visão do longo prazo e não no consumo efêmero que distingue o design da publicidade. Começar a partir do todo e não dos detalhes é que diferenciam os designers dos engenheiros. Conceber as interfaces físicas e não o espaço físico é que distancia o designer dos arquitetos. Pensar no usuário e não em si mesmo contrapõe o designer ao artista. O artista pensa no seu publico, o publicitário no consumidor, o tecnólogo no usuário e o designer na sociedade.
A consciência desse modo singular de pensamento foi sendo por mim percebida com o tempo, a partir das inúmeras oportunidades que surgiram, ou foram criadas, identificando em cada uma delas esse modo distinto de afrontar os problemas. Na maioria destes momentos tive a parceria de Marcelo Resende, responsável por construir comigo parte desse percurso profissional. Sua maturidade, visão crítica, capacidade criativa e paixão pelo trabalho foram meus maiores balizadores. A ele juntei minha ousadia, determinação e intuição. Juntos nós tentamos fazer e pensar sempre um design inclusivo, fugindo do banal, buscando o frescor das coisas originais.
Afinal, para que serve o pensamento do Design?
O pensamento do design serva na prática para buscar (e encontrar) soluções não usuais e inovadoras para um determinado problema que tenha o ser humano como foco, respeitando a diversidade cultural, sem negligenciar de nenhum aspecto do problema, questionado as implicações presentes e futuras que aquelas soluções podem ter, evitando impactos negativos sobre o meio ambiente e sobre a sociedade.
Fonte: http://eduardobarroso.blogspot.com.br/ publicado em 04/04/2013